sábado, 16 de julho de 2011

A fuga do pequeno príncipe - II

E olhando a varanda, perplexo, João olhava as pessoas, como formigas, que andavam pelas ruas, os carros vagando a esmo pela tarde vagabunda do verão. João sabia que para fugir precisaria passar pela portaria e ganhar a liberdade. Porém, como? Como descer todos os andares e passar desapercebido por alguém?

Olhou o relógio, viu que lhe sobrava tempo, não pegou dinheiro, celular, nada. Apenas trancou e escondeu a chave do apartamento num lugar aonde pai poderia encontrar depois, desceu à garagem e ficou esperando, esperando detrás de uma lixeira até o momento que como um foguete correu por toda a garagem, passou o portão, que por descuido estava aberto e ganhou enfim, sua liberdade. Discreto, passou a andar quadras e mais quadras, daquela cidade que de tão imensa parecia ocupar o mundo inteiro. A cidade da beleza, da diversidade, do crime, do pecado, que leva nome de santo, sã, são, São Paulo.

João andava confiante, afinal, aquelas ruas lhe eram familiares. Antes de ser João Pedro, era um menino sem nome, sem rosto, sem comida no estômago, ou roupa para vestir, vivia entre o Morumbi e Pari, perambulando a esmo, procurando algo para fazer. Escapou do crack por pouco, mas não da fria realidade da cidade. Ainda sim, 3 anos haviam se passado desde que ele havia deixado de ser gatuno e passara a morar com pai e maninha, a menina dos olhos cor de mel, pele clara, sorriso sincero e risada cativante. João, por esse motivo se deteve por um breve instante, olhou para trás, para a imponente construção que ocupa a Vila Olímpia, olhou, observou aquilo tudo, aquele poder, imponência, conforto de celas de ar condicionado, que prendiam os ricos inocentes. Olhou e se foi, se perder nas ruas. Era como um príncipe, tinha todo o conforto e mordomia de um pequeno monarca, mas o que ele gostava mesmo era de ser moleque, de vadiar, de ser solto, livre, viver largado. Não podia negar a essência própria. Quis renegar o passado, de que o errado lhe fazia feliz, assim como estava nos olhos daquele homem morto. Tinha até se esquecido disso, de que era da rua.

João Pedro, o de coração rebelde, entre cigarros e fugas, meninas e um único amor escondido era além, dormia ao pé da igreja, na cidade dos santos e pecadores, da dinâmica congestionada. Da poluída beleza, naquela que era a sua cidade. Ele era filho de São Paulo, ele é o pequeno príncipe de São Paulo.

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